terça-feira, 25 de agosto de 2009

Almanaque do Jovem Tecladista Moderno


Meu contrato para este blog estipulava 1 post semanal. Bom, já estou devendo uns 5 posts... então esta semana hei de compensar meus atrasos para com esta intituição bloguífera.

Para começar, um tratado de utilidade pública. Se és músico e almejas formar um conjunto de rock, e se tal conjunto necessitar de um tecladista, amigo, estás em apuros! É sabido que não existem tecladistas que gostem de rock (não nesta cidade), o que coloca os conjuntos em profundo dilema: "oh meus Deus, como minha banda irá continuar sem tecladista!?". Há uma solução muito simples: se quer um teclado na banda, toque você mesmo! Todavia, os confrades Antropocínico, Franco Larbelo e inclusive eu sabemos que isto nunca dá certo, haja visto a dificuldade insana de se conseguir aprender o instrumento de forma minimamente apresentável.

Para facilitar a vida de vocês, caros músicos-que-não-tocam-teclado-e-que-precisam-de-tecladista, postarei aqui um breve guia para apresentar àquele seu amigo de colégio que tem um Casio velho e sabe tocar "Parabéns pra Você" e "Amigos para Sempre", aquele cara que você jura que tem tudo para se tornar um Keith Emerson.

Hoje, a sensacional fase um do "Almanaque básico para o jovem tecladista moderno":

Estás a ler um pretenso guia rápido de referência para o cargo de tecladista na formosa banda (escreva aqui o nome de sua banda). Aqui pretendemos mostrar as principais referências em termo de estilo, timbres e possibilidades sonoras para o melhor uso de suas habilidades e criatividade de forma coerente com a proposta da banda.

Os tópicos que iremos abordar:
1- História do teclado no rock - Um rápido vislumbre sobre a evolução do papel do teclado ao longo da história do rock
2- Os tipos de teclado - aqui iremos conhecer os diferentes teclados utilizados, seus timbres e seus contextos

Claro que tudo recheado com indicações para audição.

Parte 1

O teclado esteve presente no universo estético do Rock desde o surgimento do mesmo, a partir dos espólios do blues e do jazz na década de 1950. Os primeiros passos do gênero foram fortemente apoiados no uso do piano, de forma mais proeminente que a própria guitarra elétrica. Pode ser estranho falar de Rock como um gênero liderado por piano e com a guitarra em segundo plano. Mas não é algo extraordinário quando notamos que o piano era um instrumento já tocado e estudado há séculos, enquanto a guitarra elétrica havia sido recém inventada. E, principalmente, por conta da origem estilística do próprio Rock, oriunda de gêneros totalmente pianísticos como o Honky Tonky e afins (também por isso o rock começou com pianos, e não com cravos ou órgãos). Dessa forma, alguns dos primeiros ídolos roqueiros eram pianistas, e o piano era o centro das antenções musicais. Destaquemos entre esses rockstars pianistas Jerry Lewis, Little Richards e Fats Domino.
O prestígio dos pianistas durou até os princípios da década de 1960. Por volta desta época, o mercado fonográfico começou a preferir investir numa fórmula mais "moderna" do rock. Esta capitaneada pelos Beatles, tinha sua gênese em subúrbios ingleses, onde os garotos pobres não tinham acesso a instrumentos caros como um piano, o que fez das guitarras o maior trunfo dos conjuntos surgidos neste contexto. Era a ascenção da guitarra, o mercado mainstream não dava muita chance para as bandas de pianistas.
No entanto, um passo importante no desenvolvimento do teclado-rock ocorria no submundo. Com a rápida valorização do rock, os músicos da noite, o proletariado musical, teve de se adaptar. Logo, uma multidão de músicos altamente treinados em jazz foram obrigados a tocar insossos e quadrados rocks para sobreviver. E assim, segundo deduzo, o rock conheceu um dos seus instrumentos mais importantes: o órgão. Falaremos mais sobre ele no próximo capítulo, pois por ora nos basta saber que o órgão já era um instrumento bem jazzy (escutai Jimmy Smith e Jimmy McGriff!). E assim, com jazzistas que tocavam rock para alimentar suas esposas e filhos, o órgão se inseriu no panteão rocker. Também há de de considerar a influência da música "gospel" neste momento, visto que o órgão era o instrumento mais comum em igrejas naquele período.
Em meados dos anos de 1960, o mercado fonográfico cansou-se do estilo de rock praticado então e, a exemplo do começo da década, decidiu o que deveria estar no mainstream. Como em toda substituição do mainstream, os que trilham pelo submundo são alçados à fama (o que na maioria das vezes confundem como revolução estética ou inserem numa boba teoria de méritos: "é tão verdadeiramente bom que, mesmo oposto à arte vigente consegue fazer sucesso!"). O sucesso repentino de conjuntos "contraculturais" preparou terreno para a grande ascenção dos teclados. Guiada por drogas e sede de novas experiências sensorias, esta nova geração de rock além de trazer à tona o órgão (algo que, como vimos, aconteceria mesmo de qualquer modo), o coloca por vezes em posição de destaque, como a guitarra e as vozes. Temos aqui conjuntos como The Doors, The Nice, Pink Floyd, Procol Harum, Moody Blues...
Além desta abertura estética, outro fator contribuiu para a inserção de teclado no rock à essa época: o desenvolvimento tecnológico. Isto permitiu o surgimento de instrumentos bem mais baratos e acessíveis, como o piano elétrico, como também fomentou o surgimento de novos instrumentos sintetizadores. Voltando à questão estética, observamos que, enquanto a grande maioria dos guitarristas era auto-didata, os tecladistas quase sempre tinham formação erudita, o que proporcionava uma abertura enorme de possibilidades para os conjuntos com tecladista.
A década seguinte foi o grande auge do rock com teclados. A abertura estética (e mercadológica) promovida nos anos precedentes fomentou a formação de conjuntos totalmente dependentes de teclados, que exploraram suas possibilidades até o extremo. Algumas até aposentaram a guitarra, baseando sua música em teclados de forma jamais vista no rock. Houveram conjuntos que percorreram as trilhas da erudição, da música clássica. Houveram outros tantos que abraçaram os caminhos do jazz. Muitos estreitaram os laços entre ambos. Outros rejeitaram ambos e navegaram pelos mares da música eletroacústica. E eu, por minha vez, me perdi em metáforas idiotas. Mas tudo isso (inclusive minhas merdáforas) só foi possível graças à introdução de instrumentos de teclado no rock'n roll. Genesis, Yes, Emerson Lake & Palmer, Jethro Tull, Renaissance, Focus, King Crimson, Gentle Giant, Frank Zappa são os mais conhecidos.
Infelizmente, a evolução tecnológica e mercantil prosseguiram num rumo trágico a partir da metáde dos '70. O resultado disto é o uso indiscriminado de sintetizadores de sons verdadeiramente vergonhosos, que fizeram com que o teclado sofresse terrível preconceito dos rockers desde então. Os próximos passos da evolução dos teclados não nos interessa. Chegamos até aqui, qualquer incursão adiante a partir deste ponto é por sua própria conta e risco.

2 comentários:

  1. Super útil isso. Eu que estou precisando somente de um tecladista para completar a banda vou ter que me virar mesmo...
    oO

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  2. Os 2 únicos ensaios em que eu trabalhei como tecladista foram totalmente um gatilho para me causar uma depressão musical profunda (não sei tocar bateria, não sei tocar violão, não consegui dominar o baixo e me fodi no teclado).

    Viva a música.

    ps: faltou Arnaldo Baptista, aquele ali sim sabia usar um orgão e um piano muito bem, principalmente na fase prog.

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