quarta-feira, 29 de julho de 2009

Contos Paranóicos, Capítulo 104 (A.K.A. Sonho No. 42)

(O narrador é um cara neurótico, de fala apressada)

Estavam Branco e Azul atravessando a rua a caminho de uma banca de revistas, Branco ia comprar cigarro.
- Um Marlboro Vermelho, por favor.
Voltando para onde estava Azul, Branco encontrou um rosto desconhecido logo à sua frente, de desconhecido, mudou, para conhecido.
- E aí, cara, beleza?
- Tudo na paz.
Azul tentou puxar conversa, sem sucesso. Como sempre, quando não se tem clima para nada, entre fumantes, sempre se tem clima para oferecer cigarro.
- Fuma um cigarrinho... - disse o Branco.
- É pô, oferece um cigarro a ele - disse o Azul, adivinhando que este ia oferecer um cigarro ao novo personagem desse conto.
Tentando restabelecer algum diálogo, desta vez entre todos, Azul pergunta:
- E aí? Só de boa passeando por aqui? Tá fazendo o que?
- Vim encontrar uns amigos por aqui...
- Não pô, digo de trabalho...
- Tô fazendo uns bico. - E acendeu o cigarro.
Eu, que sou o narrador e tudo sei do que se passa e se passará nessa história, sabia muito bem que tipo de bico esse rapaz que atende por Pezinho tava falando. Seis meses atrás, outro lugar. Corria desesperadamente até que achou uma casa de muro baixo, pulou o muro, quebrou uma janela, passeava livre pela cozinha, abriu a geladeira, a portinha do congelador caiu de novo a seus pés (ele não sabia que era de novo, mas naquela casa aquilo acontecia todos os dias), pegou uma jarra de o-que-quer-que-fosse e tomou, descobriu ser suco de manga com maracujá, especialidade daquela casa. Colocou o revólver em cima da pia, a jarra lhe escapou das mãos, e descansou no chão, estraçalhada. Meio desconfiado, correu, procurando quartos. Achou um que deveria ser de um dos filhos da família que morava ali, em cima da escrivaninha jazia um livro. Não um livro qualquer, muito menos a bíblia, mas um dicionário. Procurou o significado da palavra sodomia, quando encontrou, teve que procurar o significado de cópula, e após isso, ainda precisou procurar a palavra coito, depois teve certeza, e exclamou:
- Filho da puta! Vou matar aquele filho da puta agora! Isso não se faz!
Correu para fora da casa mas lembrou-se do revólver na cozinha. Voltou correndo, escorregou no suco e o revólver não estava em cima da pia, caído no chão, ouviu um estalo. Olhando para cima, caído donde estava, via sua arma de cabeça para baixo, apontada para si. Não falou nada, apenas esperou sua morte. Impassível, continuou olhando para o buraco do revólver, fixamente. À porta da cozinha, chegava um dos habitantes da casa, vestindo uma farda, de branco com detalhes azuis na manga, a farda passou para um vermelho quase vinho. Caiu no chão, morto. Então, Pezinho levantou-se, agarrou seu adversário por trás e tentou esganá-lo. Foi atingido por um tiro no braço, se afastou e abriu a porta da geladeira para se proteger, mas o tiro passou. Caiu, sangrando, desta vez por causa de uma bala na barriga, ficou com a vista turva e agora estava tropeçando suco e sangue. E foi tropeçando suco e sangue que seu adversário caiu, sem soltar a arma. Pezinho tentou fugir para o pátio, correndo ainda, os tiros não foram certeiros. Escondeu-se numa espécie de área de serviço, encontrou um ferro de passar e o ligou na tomada. O silêncio era grande, e o ferro já soltava fumaça. Corajoso como era, o tirou da tomada e o segurou. Olhou com um olho pela fresta que deixou na porta, não via ninguém. Repentinamente, dois tiros vazam a porta, então Pezinho a escancara, por sorte não foi acertado novamente, o que seria fatal. Desesperado, seu adversário, que foi atingido pela porta, derrubou a arma sem querer e foi queimado no rosto pelo ferro. Com a marca no rosto e gritando, tentou alcançar a arma, foi queimado novamente na nuca, mas o ferro já não estava tão quente. Pisado no braço, tentou derrubar Pezinho, que caiu, mas esticando o braço esquerdo, alcançou a arma. Deitado no chão com a arma apontada para seu adversário marcado na cara, ouviu-se um estalo, e Pezinho falou, ardendo de raiva:
- Sodomita um caralho.

Um comentário: